DUAS NOVAS ESPERANÇAS DO CINEMA BRASILEIRO
por Laurent Desbois
Texto escrito na ocasião da estreia de OMA e A Rainha da Noite, no Estação NET Botafogo, dia 04/07
Uma estreia original aconteceu na terça-feira, 4 de julho, no cinema Estação Net Botafogo, diante de uma sala lotada e extremamente jovem, cujo entusiasmo e energia lembravam os melhores momentos do Festival do Rio. Dois estudantes de cinema tiveram a boa ideia de apresentar seus primeiros filmes ao público. São dois filmes de média-metragem. OMA, com duração de 37 minutos, foi dirigido e editado por José Bial; A RAINHA DA NOITE, com duração de 46 minutos, foi escrito e dirigido por Pedro Almeida, que tinha 18 anos na época da filmagem.
Esses dois estreantes no panorama de um cinema jovem em plena efervescência foram prestigiosamente apadrinhados nessa noite. No momento em que o cinema brasileiro comemora seus 125 anos, dois de seus monstros sagrados e veteranos da época de ouro estavam nas primeiras filas para encorajar essa nova safra de talentos: ninguém menos que Carlos Diegues, por OMA, e Julio Bressane, por A RAINHA DA NOITE, onde ele aparece em pessoalmente. Um monumento do Cinema Novo e uma lenda do Cinema Marginal.
Um dos principais interesses desse programa duplo consiste em explorar duas das facetas mais interessantes e criativas do cinema de autor no Brasil: o documentário no estilo cinema-verdade por José Bial e o poema cinematográfico alegórico no estilo de arte e ensaio por Pedro Almeida.
OMA é uma homenagem de José Bial à sua avó paterna quase centenária e quase onipresente do primeiro ao último minuto. Seu neto a deixou tão à vontade na frente da câmera e do microfone que o espectador tem a confortável impressão de estar com ela em seu apartamento e de passar um momento frutuoso em sua generosa e carismática companhia. A câmera nunca é voyeurista. O amor afetuoso e respeitosamente admirativo de José por sua avó transparece em cada tomada, quer ela esteja se expressando verbalmente quer esteja em silêncio. O mais notável do filme, desde a primeira imagem, são os soberbos e emocionantes planos magnificando o corpo fanado da velhice sublimada: pescoço, mãos, pés, rugas. É um grande crédito para esse cineasta, que tem apenas 21 anos, o fato de ele ir na contramão de uma época em que o tempo passado sobre os seres é frequentemente assimilado a uma decrepitude e não a uma resolução.
Apenas duas perguntas. Por que não se evocou mais a Alemanha nazista da década de 1930, que a protagonista deixou ainda muito jovem? Por que essa personagem secundária da jovem atriz? Isso não diminui em nada a promessa desse documentário, editado com eficiência pelo próprio Bial, com planos longos que buscam a naturalidade e a autenticidade, na tradição dos documentaristas do cinema-verdade, de Edgar Morin a Eduardo Coutinho.
A RAINHA DA NOITE é um filme artístico, experimental e operístico de Pedro Almeida, um jovem cineasta melômano e cinéfilo que teve a coragem de enveredar pela difícil via do cinema alegórico, uma das mais interessantes e estimulantes da sétima arte, mas também a mais hermética e, portanto, às vezes, confusa. Se o espectador gosta de se deixar hipnotizar e embarcar em uma viagem onírica, este é o filme para ele. Se ele é mais
racional e cartesiano, sua retina ficará indelevelmente marcada por esplêndidos flashes puramente estéticos.
Porque as musas inspiraram Pedro Almeida, e algumas das sequências e planos do filme poderiam se tornar antológicos, como o turbilhão de imagens caóticas e rodopiantes logo após a abertura, ou o longo e notável plano-sequência em travelling circular em torno do Jardim das Estátuas. É preciso saudar o trabalho refinado da trilha sonora, que mistura o Mozart real com um Mozart revisitado de forma insólita. Cidade que se torna inquietante nesta Noite onde uma jovem misteriosa parte em busca de sua Rainha, poucas vezes, que eu saiba, o Rio de Janeiro foi filmado com esse toque fantástico e poético, mais comum em filmes rodados no inverno em Veneza ou Bruges. A fotografia delicada, variada e magistral de Vinícius Dratovsky, a música arrebatadora de Paulo Villaça, o olhar enigmático de Camilla Tavares, o charme venenoso de Raquel Maia e a presença espectral de Júlio Bressane: todos esses são trunfos desse opus primum concebido, editado, dirigido e orquestrado com invenção e maestria por um artista de 19 anos. Apesar de alguma cenas que poderiam ser mais concisas, A RAINHA DA NOITE se revela uma ode e uma experiência cinematográfica inteligente, fascinante e promissora. Nasce um cineasta.
Temos certeza de que veremos Pedro Almeida e José Bial no próximo capítulo da sempre surpreendente odisseia renovada do cinema brasileiro.
LAURENT DESBOIS é ex-colaborador da revista CAHIERS DU CINÉMA e autor do livro A ODISSEIA DO CINEMA BRASILEIRO - da Atlântida à Cidade de Deus (Companhia das Letras 2016).
DEUX NOUVEAUX ESPOIRS DU CINÉMA BRÉSILIEN (versão original em francês)
Une estreia originale a eu lieu le mardi 4 Juillet au cinéma Estaçao Net de Botafogo, devant une salle archipleine et extrêmement jeune dont l ́enthousiasme et l ́énergie rappelaient les meilleurs moments du Festival de Rio. Deux étudiants de cinéma ont eu la bonne idée de présenter au public leur premier film. Il s ́agit de deux moyens métrages. OMA, qui dure 37 minutes, est réalisé et monté par José Bial ; A RAINHA DA NOITE, qui dure 46 minutes, est écrit et réalisé par Pedro Almeida qui avait 18 ans au moment du tournage.
Ces deux nouveaux venus dans le panorama d ́un jeune cinéma en pleine effervescence étaient prestigieusement parrainés ce soir-là. Alors que le cinéma brésilien fête ses 125 ans, eux de ses monstres sacrés et vétérans de l ́âge d ́or étaient aux premiers rangs pour encourager cette nouvelle safra de talents : rien moins que Carlos Diegues pour OMA et Julio Bressane pour A RAINHA DA NOITE où il apparaît en personne.
Un monument du Cinema Novo et une légende du Cinéma Marginal.
L ́un des principaux intérêts de cette double programmation consiste à explorer deux des versants les plus intéressants et créatifs du cinéma d ́auteur au Brésil : le documentaire tipo cinéma-vérité pour José Bial, le poème cinématographique allégorique tipo art et essai pour Pedro Almeida.
OMA est un hommage de José Bial à sa grand-mère paternelle quasi centenaire et presque omniprésente de la première à la dernière minute. Son petit-fils l ́a tellement mise à l ́aise face à la caméra et au micro que le spectateur ressent la confortable impression d ́être avec elle dans son appartement et de passer un fructueux moment en sa compagnie généreuse et charismatique. La caméra n ́est jamais voyeuriste. L ́amour affectueux et respectueusement admiratif que José voue à son aïeule transparaît à chaque plan, qu ́elle s ́exprime verbalement ou qu ́elle soit silencieuse. Le plus remarquable du film, ce sont, dès la première image, ces plans superbes et émouvants magnifiant le corps fané de la vieillesse sublimée : cou, mains, pieds, rides. A contrepied d ́une époque où le temps passé sur les êtres est souvent assimilé à une décrépitude et non à une résolution, c ́est tout à l ́honneur de ce cinéaste à peine âgé de 21 ans.
Juste deux interrogations. Pourquoi ne pas avoir davantage évoqué l ́Allemagne nazie des années 30 quittée très jeune par la protagoniste ? Pourquoi ce personnage secondaire de la jeune actrice ? Cela n ́enlève rien aux promesses de ce documentaire efficacement monté par Bial lui-même, en longs plans traquant le naturel et l ́authenticité, dans la tradition des documentaristes du cinéma- vérité, d ́Edgar Morin à Eduardo Coutinho.
A RAINHA DA NOITE est un film artistique, expérimental et opératique de Pedro Almeida, très jeune cinéaste mélomane et cinéphile ayant le courage d ́emprunter la voie difficile du cinéma allégorique, l ́une des plus intéressantes et stimulantes du septième art, mais aussi la plus hermétique donc déroutante parfois. Si le spectateur aime se laisser hypnotiser et embarquer dans un voyage onirique, voici un film pour lui. S ́il est plus rationnel et cartésien, sa rétine ne manquera cependant pas d ́être imprimée durablement par de splendides flashes purement esthétiques.
Car les muses ont inspiré Pedro Almeida et certaines séquences ou certains plans du film pourraient devenir anthologiques, tel ce tourbillon d ́images chaotiques et virevoltantes peu après l'ouverture, ou le très long et remarquable plan-séquence en travelling circulaireautour du Jardin des Statues. Il faut saluer le travail raffiné sur la bande sonore où s ́entremêlent le vrai Mozart et un Mozart insolitement revisité. Cité devenue inquiétante en cette Nuit où une mystérieuse jeune fille part en quête de sa Reine, rarement à ma connaissance Rio de Janeiro aura été filmée avec cette touche fantastique et poétique plus habituelle dans des films tournés en hiver à Venise ou à Bruges. La photographie délicate, variée et maîtrisée de Vinícius Dratovsky, la musique envoûtante de Paulo Villaça, le charme vénéneux de Raquel Maia et la présence spectrale de Julio Bressane : que d ́atouts pour cet opus primum conçu, monté, dirigé et orchestré avec invention et maestria par un artiste de 19 ans. Malgré quelques petites longueurs, A RAINHA DA NOITE se révèle une ode et une expérience de cinéma intelligente, fascinante et prometteuse. Un cinéaste est né.
On retrouvera certainement Pedro Almeida et José Bial dans le chapitre à venir de la toujours surprenante odyssée renouvelée du cinéma brésilien.
LAURENT DESBOIS, ex-collaborateur des CAHIERS DU CINÉMA - Auteur da ODISSEIA DO CINEMA BRASILEIRO da Atlantida à Cidade de Deus (Companhia das Letras 2016)